Só paz


Curiosamente o pessoal do Google não deletou os perfis de quem usava o Google Reader, então o que foi compartilhado antes da mudança continua lá. Descobri isso por acaso e como um dos meus nomes é nostalgia fui ver quais tinham sido as últimas coisas que compartilhei com quem caísse nos meus itens compartilhados. Encontrei coisas boas lá, coisas que realmente mereciam ter sido compartilhadas. Outros itens me fizeram perguntar "onde eu estava com a cabeça pra compartilhar um troço desses".
Mas é fim de ano, e com ele vem o natal.  Desnecessário dizer mais uma vez o quanto eu não gosto de finais de ano. Finais de ano não me lembram coisas boas e nada ao meu redor permite que eu me comporte como se estivesse numa data qualquer.  Fim de ano é algo muito Simone-de-terninho-branco-cantando-'Então-é-Natal' (e além da roupa roubada do especial do Roberto Carlos - outro porre, ela também não deixa em casa um cagaio de 'harehama Hiroshima' - ?? - no fim da música), versão brazuca para War is over, que mesmo sendo fã dos Beatles, passei a desgostar por tabela. Quando ouço 'so this is christmas' ou 'então é natal" já me dá uma certa vontade de correr.
E foi justamente vendo um dos meus itens compartilhados que encontrei algo bem mais legal pra ser usado como mensagem de fim de ano. E era algo do John. John Lennon sem so-this-is-christmas nessa época é algo de inenarrável valor. Se bem que não sei se é mesmo dele, mas tá valendo, porque o mundo tá tão sinistro que qualquer mensagem de paz tá valendo muito.



Aceitei isso como um presente de fim de ano do finado GReader. Não vou considerar violência valendo só para agressões físicas, mas para as palavras e principalmente as ações. Preciso lembrar mais vezes que as pessoas que não querem o meu bem (e que tem uma vida tãããão interessante que dedicam algum tempo a isso) não sabem como agir se a atitude babaca não for devolvida. Assim sendo, o que posso desejar a mim mesma no próximo ano é não devolver as coisas ruins mesma moeda. Rir é bem melhor. Tentei fazer isso em 2011 mas nem sempre tive sucesso, vou procurar aprimorar a técnica para 2012. Brincar de Tistu.
Que 2012 seja um bom ano pra você!



Ouvindo: Oasis - I'm Outta Time

Sou do tempo em que havia brincadeiras de criança

Houve um tempo onde as crianças brincavam na rua. Me lembro bem de andar de bicicleta, jogar queimado, furinguinho de gato, as mais variáveis versões de pique (pique-esconde, pique-pega, pique-bandeira, pique-alto...) e outras brincadeiras. Na verdade, a frase inicial deveria ser outra: houve um tempo onde as crianças brincavam.
Criança de hoje em dia brinca? Fora videogame, elas jogam vôlei, futebol, basquete, handebol, tênis, remam, nadam... mas tudo isso em escolinhas profissionalizantes. E essas escolas existem para quase tudo e são “para crianças de todas as idades”, como diz a propaganda de uma delas. Isso já se tornou algo muito comum pra me causar espanto, mas posso te dizer que ainda me impressiono de certa forma. 
Me impressiona que não se brinque mais de ser modelo, que invés disso as crianças estejam frequentando cursos para aprender a modelar desde as fraldas. Me impressiona que bolas de futebol não estejam mais entre os brinquedos mais desejados no fim de ano, não pelo fato de as crianças não quererem mais, mas por não serem mais considerados brinquedos e sim uma espécie de investimento. 
Ou eu sou completamente inadequada para a sociedade ou alguém tem que rever as diretrizes desse negócio de maternidade/paternidade porque, numa boa: pais de hoje em dia, vocês estão fazendo isso errado. Se eu fosse mãe de santo, taróloga ou qualquer uma dessas pessoas que dizem prever o futuro, poderia afirmar com toda certeza que a previsão para as próximas gerações não são muito boas.


  
Hoje é dia de brincar de garantir o futuro da família, bebê!

Alguns trocados


Joelson cabisbaixo, com cigarro entre os dedos, sentado na escada. Levantou. Abriu a carteira e viu que só tinha alguns trocados. Trocados. Pensou numa metáfora que explicasse sua situação, tantas boas oportunidades foram trocadas por outras que no fim não valeram tanto a pena. Lembrou do que não trocou, das coisas que não abriu mão, de tudo pelo que lutou e não valeu a pena.

Trocado. Quando chegou em casa já de madrugada e viu que havia sido trocado. Sua esposa saíra de casa, o abandonara, levando os filhos e deixando apenas um bilhetinho. Trocado por um pedaço de papel, Joelson naquele momento acordou e percebeu que deveria ter acordado antes. Entrou no apartamento vazio e só encontrou um “cansei, não dá mais”. Por que ela tinha que ter sido tão sucinta? E as coisas que ele teve que aguentar e abrir mão por causa do relacionamento, não importavam? Abateu-se num misto de fleuma e ressentimento.
Saiu das escadas, voltou ao apartamento. Sentou no sofá da sala e por lá ficou até o amanhecer. Preferiu não ir procurá-la. Dentro de toda sua mágoa, não ligou, não tentou contato. Deixou o tempo passar na esperança de que suas feridas fossem curadas por ele. As semanas foram se passando, a barba por fazer já começava a ficar mais espessa e ele decidiu que era hora de tomar uma atitude, de mudar e ia começar fazendo a barba. Entrou no mercadinho da esquina, comprou um barbeador novo e na hora de pagar se viu novamente diante de trocados.
Relembrou o que vivera e decidiu que não queria trocar o que vivera por nada.

Relacionamento sério



Moravam juntos já fazia mais de dois anos, e numa quarta-feira ela jogou pra ele uma revista enquanto tomavam café da manhã:
- Tá vendo?
Ele leu o enunciado da reportagem e não sabia bem o que responder. Um casal famoso tinha terminado seu relacionamento porque um adorava redes sociais e o outro era tecnofóbico. O que ela esperava dele? Logo dele que só ligava o computador para planilhas e e-mails!
- Mas eu não vejo sentido no Twitter, amor - procurou se explicar.
- Tenta.
E para atender o pedido quase intimação de sua querida, ele foi tentar. Sentou no computador e criou seu perfil no microblog. Seus amigos ficaram felizes em tê-lo por ali. No primeiro dia saiu para o trabalho e a cada sinal vermelho procurava algo que pudesse postar. Postou foto do cara que faz malabarismo, do menino que vende balas, teceu comentários, interagiu e começou a gostar da coisa. Semanas depois, ele mesmo se dizia tuiteiro.
Ela se sentiu feliz ao ver não só que ele tinha se esforçado para fazer parte do mundo dela, mas por perceber que tinha gostado. Ele parecia mais animado no relacionamento ao ver através da rede o quanto ela o admirava. Todos os amigos percebiam que o relacionamento do casal tinha melhorado, os dois conversavam mais, se compreendiam mais, tinham mais assunto, passavam mais tempo pensando um no outro.
Pouco tempo depois alguém sugeriu que tivesse um perfil em outra rede social, onde poderia ir além das frases curtas e lá foi ele se aventurar em mais um campo desconhecido. Pela experiência anterior aceitou a sugestão com boa vontade e se viu novamente diante do computador criando seu perfil. Pensou que ela iria gostar de ver a surpresa quando voltasse do trabalho, montou um álbum com fotos dos melhores momentos que tinham passado juntos desde que se conheceram, colocou na legenda de cada foto uma frase retirada das músicas ou dos filmes preferidos dela. Os amigos estavam curtindo cada foto postada, comentando sobre como tinham sido feitos um para o outro, quando ele finalmente foi ao perfil dela para adicioná-la e escrever algo em seu mural.
Deu um murro na mesa! Não acreditara no que viu. Olhou de novo e puto da vida ligou pra ela.
Por telefone, com olhos mareados, raiva na voz e coração partido, pôs um fim na união que completaria três anos, depois de ver que ela havia marcado apenas como namoro aquilo que ele considerava um relacionamento sério.
Postou o verso de uma música com o link pro You Tube: “She's going to smile to make you frown, what a clown!”, desligou o celular, saiu batendo a porta, preferiu descer pelas escadas. Ainda meio desnorteado acabou contando tudo isso pro Carlinhos, um garcon do boteco da esquina.


Ouvindo:
Coralie Clément - Un beau jour pour mourir

Eu quero a sorte de um amor tranquilo, com sabor de bombom mordido


“I don’t believe that Darwin was god
but I’m very thankful to him”


Eu disse que não era darwinista, mas que Darwin explicava tudo. Ele riu. Um sorriso mais de empatia que de deboche. Falavamos dos defeitos do meu perfeccionismo. De como gosto de tudo certinho, cada coisa no seu lugar, leio manuais de instruções, mas tem horas que não dou a mínima pra organização.
Acho que não existe manual para tudo, não existe maneira correta de agir em todas as situações. Não somos máquinas, não fomos feitos em série. O que dá certo para uma pessoa, o que é bom pra alguém, o que vale naquele momento e naquela situação, pode só servir ali. 
Eu não sou surpreendente, sou até bastante previsível, só que entendi com o tempo que cada momento, situação, pessoa e lugar precisa de uma forma de agir, não existe atitude pasteurizada ou fórmula mágica. É necessário agir de acordo com a situação e o momento. Você pode sentar na mesa de um pé sujo com os amigos calçando de havaianas, falando palavrões, beliscando os petiscos com as mãos enquanto canta batucando na mesa. Mas se for um jantar com o chefão, num restaurante mediano, vai ser diferente. Da mesma forma que ninguém faz as mesmas piadas para todas as pessoas do seu convívio. Imagina contar os mesmos segredos pra todo mundo? Tem gente que não merece certas atenções, tem gente que merece todas as atenções do mundo. Situações diferentes, posturas diferentes. 
Eu não sou surpreendente, nem tenho a pretensão de surpreender, só tenho esse defeito de nem sempre conseguir disfarçar a espontaneidade, de às vezes ser transparente demais. E as pessoas normalmente (e talvez até naturalmente - Darwin, cara) encobrem sua espontaneidade. Mas eu muitas vezes quando percebo, como num reflexo, já falei, já fiz, já ri. E aí já era.
Ele sorriu de novo. Eu sorri de volta. Rimos juntos. 


Ouvindo: Cascadura - Senhor das moscas


*Citação no início da postagem tirada da música do Letuce: Darwin's Fairy Tale

A oração de Janis Joplin


Na tiração de sarro, por volta de 1970, Janis Joplin compôs Mercedes Benz com outros dois caras. Mesmo após 40 anos, sua letra continua atual. Pra quem não conhece (se é que existe tal pessoa), a música é uma espécie de oração, na qual se pede de uma Mercedes até uma rodada de bebidas, passando por uma TV a cores. Janis estava satirizando o que as pessoas colocam como prioridade.
Eu não acredito no poder da oração, mas acredito em pessoas. E por acreditar em gente de carne e osso (e independente de não crer em misticismos), tenho lá minhas dúvidas com relação ao naipe do ser humano que pede frivolidades para quem quer que seja quando acredita que seus pedidos podem ser atendidos. 
Então a vizinha está rezando para conseguir uma “boa empregada doméstica” (leia-se alguém que tope voltar aos tempos da escravidão). Numa igreja por onde passo a caminho do trabalho, há uma faixa na porta com o convite para a “corrente da derrota dos inimigos”. Lideranças católicas e pentecostais se unem contra os direitos de pessoas que sentem atração por outras do mesmo sexo. Na TV um pastor sugere que os fiéis participem de uma campanha para “prosperidade financeira”. Instituições religiosas arrecadam verba para enviar bíblias a países onde grande parte da população morre de fome. Igrejas evangélicas desrespeitam leis trabalhistas. Igreja Católica luta para doutrinar crianças na escola pública. Igrejas são contra a adoção de crianças por casais homossexuais. Pastor cria dízimo por débito automático. Religiosos se unem para proibir projeto de cinema itinerante em escolas no Acre. Igrejas protestam contra distribuição gratuita de camisinhas. Igrejas são contra o direito de um casal decidir quando e se querem ter um filho. Igrejas pouco fazem para evitar e punir casos de pedofilia, estupro e outros abusos sexuais dentro de seus domínios. Deputados evangélicos declaram abertamente que chantagearam a presidenta e fingirão que não estão vendo certas irregularidades para que a mesma cedesse a um desejo deles. Os grandes pensadores do cristianismo eram contra o meu direito de pensar. Até hoje instituições religiosas promovem fogueiras de livros seculares. 
Qual a prioridade dessa gente? Não parece ser amar o próximo, não me parece ser algo além do individual, não me parece ter a ver com respeito com os demais.




Nossa Senhora do Tablet com Android, rogai por nós!


Considerações sobre o estupro


Um dos assuntos que mais tenho visto em pauta é o estupro, ou talvez o que tenha despertado minha atenção seja a repetição com tanta frequência. Dos últimos, o mais bizarro e ultrajante envolve uma decisão da justiça de Portugal, que absolveu um psiquiatra acusado de abusar sexualmente de uma paciente - grávida com depressão - alegando que ele não tinha sido violento o bastante. Isso mesmo que você leu, se tivesse deixado escoriações, hematomas ou fraturas, talvez fosse condenado. Foi absolvido por “pegar leve”.
Se bem que eu não sei se esse foi o caso mais repugnante dos últimos meses, já que não faz muito tempo, nos E.U.A uma adolescente teve que pedir desculpas (!) por ter sido estuprada por um membro da mesma igreja que frequenta(va). Invés do apoio da comunidade religiosa, ela foi obrigada a pedir desculpas à congregação por ter provocado tais desejos no estuprador! Dá pra dizer que foi estuprada duas vezes, fisicamente pelo criminoso e moralmente pela criminosa igreja.
No Canadá um policial declarou que as mulheres são estupradas porque se vestem como putas (e isso gerou um movimento que depois que perdeu a ironia se tornou estúpido que se espalha pelo mundo chamado slut walk). Não duvido nada que muita gente por aí partilhe do mesmo pensamento e não seria difícil encontrar essa linha de raciocínio entre nossos “homens da lei”. Nesse caso, alguns poderiam dizer que “todo cuidado é pouco”, mas criar um padrão de estuprável é tão asqueroso! É como dizer que quem não quer ter o carro roubado não deve andar de carro! Não, filho, a culpa não é do jeito que a mulher estiver vestida (por mais vulgar que te pareça), a roupa não dá a ninguém acesso livre ao corpo alheio na base da força (violação).
Quando fui procurar os links das notícias para essa postagem, me impressionou a quantidade de sites pornôs que surgiram na busca. A categoria rape existe em diversos sites dedicados à pornografia. Um fetiche sádico. Há um incontável número de pessoas que se excitam ao ver um estupro e porque o sexo, em pleno 2011, ainda é visto como tabu pela sociedade, pouca gente conversa sobre isso. Podem achar que sou conservadora demais, mas fazendo uma ligação entre as diversas “piadas” (contadas desde sempre) com o tema, o fato de sermos criados ouvindo coisas como dizer-não-é-dizer-sim (atire a primeira pedra quem nunca escutou alguém dizer que fulana diz que não, mas quer, só tá fazendo doce), o conservadorismo machista que ainda impõe que homem tem que provar sua virilidade, o culto à mulher objeto e os tabus religiosos, não sei se chegaríamos a outro resultado (sem contar com a crença que muitos tem de que o desejo sexual do homem é maior que o da mulher).
Esse é o crime com o maior aumento de ocorrências nos E.U.A. A cada duas horas um caso de estupro é registrado no estado do Rio. No interior de São Paulo os crimes de estupro aumentaram 17%, na Bahia o aumento foi de 36%. Experimenta colocar estupro na busca de notícias do Google nas últimas 24 horas. O número de reportagens para um único dia é espantoso.
O estupro por si só já é um crime repugnante. E como se isso não bastasse, é comum que ele venha com um acompanhamento que consegue o transformar em algo ainda mais doloroso: em muitos casos se coloca a culpa na vítima (o que não ocorre se a acusação de estupro tiver fins políticos).
Mas o pior nisso tudo é que o crime é tão comum que nesses poucos minutos que você perdeu lendo esse texto, várias mulheres foram ou estão sendo estupradas. Grande parte dos criminosos ficará impune.


Ouvindo: R.E.M. - At most beautiful


P.s.: E tinha me esquecido do horrendo estupro "corretivo".

Eu sou do tempo em que a gente se telefonava

- Ei, moça! Não é defeito, não, seu telefone tá sem linha.

Estava folheando a revista de domingo e me deparei com o ingrediente que me faria malescrever essas linhas. Na parte musical, destaque para o show de lançamento de um disco chamado Eu sou do tempo em que a gente se telefonava. Pronto. Desnecessário dizer mais uma vez o quanto sou aficionada por títulos (interessantes).
Não sei você, mas também “sou do tempo em que a gente se telefonava”. E telefonar não era enviar um sms pedindo para alguém entrar no MSN ou no Skype. A gente discava um número, uma outra pessoa dizia “alô” e começávamos a conversar, muitas vezes por horas. Isso acontecia no século passado, onde eu nasci. Hoje olho para o meu celular e qual a principal função dele? Ouvir música. Coloco meu fone de ouvido e vou para todos os lugares curtindo minha própria trilha sonora, como se fosse possível deixar o resto do mundo em mute por alguns instantes. E mais: na maioria das vezes quase xingo quando está tocando AQUELA música e uma ligação interrompe.
Das pessoas que conheço, chuto que apenas para umas três a principal função do telefone seja fazer ou receber ligações. A maioria quer saber mesmo do wi-fi, dos aplicativos, os outros se ligam na câmera e/ou no mp3 player. Você mesmo pode perguntar aos seus amigos o motivo de terem comprado o aparelho que tem. Aposto que não vai ouvir que foi pela qualidade das ligações (“Cara, eu comprei esse celular pra poder falar com as outras pessoas sem nenhum traço de ruído e elas me escutarem como se eu não estivesse falando com um megafone dentro do banheiro minúsculo de algum inferninho”).
Quando eu era adolescente, o celular representava uma certa independência, era ter um aparelho só meu, uma linha exclusiva. Nunca gostei de telefone, mas gostava menos ainda de falar certas coisas na frente de todo mundo. Lembra daquele comercial do governo, “celular... com a sua idade sua mãe nem sonhava em ter um”? Talvez sua mãe quisesse um telefone fixo quando tinha sua idade. Gosto de observar como certas coisas mudam conforme o tempo passa, apesar de algumas mudanças me assustarem às vezes.
Eu sou do tempo em que a gente se telefonava mas acho ótimo não ter mais que te ligar.
Se o disco é bom? Digamos que não é um disco que eu compraria. É, eu sou do tempo em que a gente comprava discos (e muitas vezes comprava por causa de uma única música). Mas essa já é outra história.

Ouvindo: Blubell - Chalala Original

Seja feita a vossa vontade


Votei pela primeira vez em 2002. Em 2005, minha terceira ida às urnas não foi para escolher legisladores, mas para decidir sobre algo que os mesmos não tiveram coragem suficiente para votar: a proibição da venda de armas de fogo no Brasil.
Na ocasião, depois de diversos debates, após conhecer os argumentos de quem era contra e de quem era a favor e várias discussões em mesas de bar e em almoços de domingo com a família, a sociedade brasileira decidiu que a venda de armas não fosse proibida e que maior rigor nas regras para porte/compra bastavam.
Na minha opinião e análise simplista, quem compra uma arma pretende atirar (em alguém) e quem atira ou é polícia ou é bandido. Não vejo meio termo, é simples: se você não é bandido nem polícia, nem mora no Pantanal e tem que se proteger da Juma, não deve ter uma arma. Por isso, e por outros motivos e estatísticas que não preciso colocar aqui, em 2005 votei pela proibição das armas. Vindo de alguém que cresceu com O menino do dedo verde na estante (não, o livro não é sobre dorgas), essa opinião não deve surpreender.
Após a tragédia na escola em Realengo, minha timeline se inundou de gente fazendo a mesma pergunta: estão lembrados dos argumentos do “Não” no plebiscito do desarmamento? E assim, movido pela comoção nacional, o assunto voltou à tona.
Só tem um porém: quem defende que haja um novo plebiscito são as pessoas que votaram “a favor das armas” e se arrependeram ou quem perdeu e quer aproveitar um momento oportuno para tentar outra vez? Se foi dada à população o poder de decisão direta, o voto da maioria deve ser respeitado. É o que entendo por democracia. Digo isso porque se eu fizesse (e se num futuro referendo sobre outros temas eu fizer) parte da maioria, gostaria que meu voto valesse alguma coisa. Do contrário, a realização de referendos só serve para gastar dinheiro público e colocar alguns nomes políticos muitas vezes nada nobres em evidência.
Resumindo: Sou contra a venda de armas por n motivos e sou contra que o “cidadão comum” tenha direito ao porte, mas também sou contra que uma decisão popular tão recente seja tratada como algo sem valor.
Plebiscito não é A Lagoa Azul, não é para ser repetido a toda hora. Se o povo assim decidiu, que seja feita a sua vontade.


Ouvindo:
Letuce - Tuna fish


Atualização (03:40 am)

Do querido e insone Matheus Vasconcelos, por e-mail: "O que tivemos em 2005 foi um referendo. Plebiscito ocorre quando a população é convocada para decidir algo, antes da decisão do governo. No referendo, a população é convocada para decidir se concorda ou não com uma decisão já tomada".